Sereno: “Orgulho-me de ter feito parte de um dos melhores plantéis do FC Porto”

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Sereno: “Orgulho-me de ter feito parte de um dos melhores plantéis do FC Porto”

Recém-consagrado campeão indiano, o defesa central português Sereno pondera seriamente colocar um ponto final numa carreira, cujos momentos mais marcantes passa em revista nesta entrevista,

Artigo de André Cruz Martins

20-04-2018

Duas épocas na SuperLiga indiana e dois títulos de campeão nacional. É este o excelente registo do central português Sereno, primeiro em 2016, ao serviço do Atlético de Kolkata e há poucas semanas pelo Chennaiyin FC. O defesa foi titular na final do campeonato, diante do Bengaluru (vitória por 3-2), num jogo em que um dos golos do rival foi apontado por Sunil Chhetri, jogador que passou pelo Sporting.

Apesar de só ter 32 anos, Sereno confessa-nos que muito provavelmente chegou a hora de pendurar as chuteiras, devido às dores fortes num joelho que se têm intensificado nos últimos anos. É pois a altura ideal para passarmos em revista os melhores momentos de uma carreira que começou no Alentejo profundo, ganhou mediatismo no V. Guimarães e prosseguiu no FC Porto, onde ainda fez 13 jogos em 2010/11, uma das melhores temporadas da história dos azuis e brancos, coroada com a conquista do campeonato, Liga Europa e Taça de Portugal.

Depois e antes de chegar a terras indianas, passou por Alemanha (Colónia e Mainz), Espanha (Valladolid e Amería) e Turquia (Kayserispor). Isto sem esquecer as duas internacionalizações A que somou no consolado de Paulo Bento.

Duas épocas na Índia e dois títulos de campeão. Como foi esta última conquista e a festa que se seguiu?
Sim, é verdade, tudo correu da melhor forma nesta minha passagem pela Índia. Depois do jogo que nos deu o título fomos recebidos pelos nossos adeptos no aeroporto, que fizeram uma grande festa, como é natural. Ainda por cima, o Bengaluru era considerado favorito e na fase regular terminou em primeiro lugar, enquanto nós fomos segundos. A final foi um jogo de loucos, em que começámos a perder e conseguimos dar a volta. Ao longo da época, penso que a nossa grande força esteve na organização coletiva e na forma como defendemos.

A sua equipa tem muito adeptos? Sente que o futebol tem ganho projeção na Índia nos últimos anos?
Sim, cada vez mais. O futebol já tem o estatuto de segunda modalidade preferida dos indianos, logo atrás do criquete, que é o desporto nacional. Há 1200 milhões de habitantes na Índia, por isso é normal que entre tanta gente, haja muitas pessoas a gostar de futebol (risos). Não tenho noção do número de adeptos do Chennaiyin, mas sei que a página do clube no Facebook tem mais de 120 mil seguidores.

Vai continuar no futebol indiano?
Não sei ainda com 100 por cento de certezas, mas é muito provável que não. Fisicamente tenho tido problemas e estou a ponderar seriamente deixar de jogar futebol. Fui operado a um joelho aos 22 anos e ao longo dos anos passei a estar cada vez mais limitado.

Como classifica o nível atual do futebol indiano?
Claro que falta escola aos jogadores indianos, que são muito fracos taticamente, mas são melhores tecnicamente do que por exemplo no Catar ou na China. A intensidade de jogo não é alta, até devido ao muito calor que lá faz e a qualidade de jogo nada tem a ver com as Ligas europeias, mas não é um campeonato tão fraco como se pensa. E os clubes têm condições de trabalho cinco estrelas, com ótimos estádios e centros de estágios. Na minha opinião, eles têm boas condições para evoluir, até porque o nível de organização da SuperLiga é bastante elevado.

Como era a sua vida na Índia?
Foi mais uma experiência importante, pois apesar de viver num hotel tive a possibilidade de conhecer uma cultura muito diferente da europeia. O trânsito é uma verdadeira loucura e demora-se muito tempo para fazer poucos quilómetros. O problema é que devido à grande dimensão do país temos mesmo de nos deslocar de carro. E eles são loucos a conduzir, não há cá piscas nem sinais de trânsito. O que vale é que era sempre conduzido por um choffeur.

E gostou do povo indiano?
Sim, sim, são pessoas com muito bom coração e que recebem muito bem. Mas claro que o país não tem o nível de higiene a que os europeus estão habituados.

“Os meus pais não me deixaram sair do Alentejo até ter 18 anos e terminar o 12º

Regressemos ao início da carreira. É alentejano e fez toda a formação no Elvenses e no Elvas. Até que aos 20 anos deu um grande salto, para o V. Guimarães.
Durante os meus anos na formação já tinha tido várias oportunidades de passar a representar um clube de maiores dimensões, mas os meus pais não me deixaram sair do Alentejo até ter 18 anos e terminar o 12º. Pouco depois, aceitei o convite do V. Guimarães, o clube que me ensinou tudo. Quando cheguei estávamos na II Liga, mas subimos ao escalão principal nessa época e logo depois ficámos em terceiro lugar na I Liga. Sem dúvida que o V. Guimarães foi uma excelente escolha.

Os adeptos do V. Guimarães são conhecidos por apoiarem muito os jogadores, mas também por lhes darem grandes “apertões” quando as coisas correm mal. Teve algum caso mais complicado?
No meu caso, só tive experiências positivas, pois apanhei uma boa fase do clube, com bons resultados. Mas gosto muito da forma como os adeptos apoiam o Vitória e é normal que protestem quando sentem que um jogador não dá tudo o que pode. Se eles sentirem que os futebolistas se entregam a 100 por cento, não criam problemas.

Esteve no V. Guimarães até 2009 e depois de meia época no Valladolid assinou pelo FC Porto. Como qualifica a sua passagem pelos dragões?
Cheguei com muitas expetativas. A equipa vinha de um mau ano, em que tinha perdido o título de campeão nacional para o Benfica. Tenho orgulho por ter feito 15 jogos durante a época num dos melhores plantéis de sempre do FC Porto. O treinador aproveitou a minha polivalência e joguei a defesa central e defesa direito, entrando para a história do clube, ao conquistar campeonato, taça e Liga Europa.

Qual era o grande segredo desse fantástico FC Porto?
O nosso ponto forte era a forma como nos treinávamos, sempre com empenho ao máximo. Posso dizer que os treinos eram mesmo muito “rasgadinhos”. E, claro, havia grandes jogadores como Hulk, Falcao e muitos outros.

Para além de Portugal e Índia, jogou nos campeonatos espanhol, alemão e turco. Qual deles gostou mais?
Sem dúvida o espanhol, que tem equipas de grande qualidade, com estádios sempre cheios e onde a competitividade é acentuada. Também tenho de destacar a Bundesliga, mas não me diverti tanto como em Espanha, pois os treinos eram muito mais pesados e chovia muito. Isto para além das pessoas serem mais frias. Na Turquia, as pessoas são espetaculares e gostei muito de lá ter estado, apesar de ter vivido na parte muçulmana, com aquelas rezas a toda a hora. A sexta-feira era o domingo deles, não trabalhavam. Ainda hoje tenho amigos turcos com os quais falo frequentemente.

Qual foi o treinador que mais o marcou?
O André Villas-Boas marcou-me muito, tal como o Vítor Pereira e o Paulo Sérgio. Mas sem dúvida que ninguém me marcou mais do que o Manuel Cajuda. Primeiro que tudo, por ter tido a coragem de apostar em mim, quando era um jovem desconhecido, vindo do Elvas. E depois porque era um grande treinador e tinha sempre uma história engraçada para nos contar antes do treino, que nós ouvíamos com toda a atenção.

Quer contar-nos alguma dessas histórias?
Deixe lá pensar. Agora não me ocorre nenhuma, mas já me vou lembrar e já lhe conto.

“Fiquei adepto do V. Guimarães, depois da minha passagem marcante pelo clube”

Qual foi o jogador com quem mais gostou de formar dupla no centro da defesa?
O Geromel, nos meus primeiros anos no V. Guimarães, penso que formávamos uma boa dupla e completávamo-nos muito bem. Mas não me posso esquecer que joguei ao lado de grandes centrais, como o Pepe, o Otamendi, o Rolando e o Maicon.

Considera que o seu ponto mais alto foi ter chegado à seleção nacional, no tempo de Paulo Bento, quando somou duas internacionalizações A?
Sim, tenho muito orgulho por ter representado uma seleção de nível mundial, que está habitualmente nos sete primeiros lugares do ranking da FIFA. Só tive duas internacionalizações, mas fui chamado outras vezes. Estive perto de ir ao Campeonato da Europa de 2012, mas infelizmente lesionei-me um pouco antes da competição.

Como foi trabalhar com Paulo Bento?
É uma pessoa muito direta e franca e gostei muito de trabalhar com ele na seleção nacional. Com ele, conseguimos realizar um excelente Euro 2012 e só foi pena as coisas não terem corrido bem no Mundial 2014.

Hoje em dia qual é o seu clube?
Fiquei adepto do V. Guimarães, depois da minha passagem marcante pelo clube. Quanto aos três grandes, a minha preferência vai sempre para o FC Porto e estou muito satisfeito pelo atual primeiro lugar que ocupa no campeonato, que considero merecido, pois tem dado grandes espetáculos de futebol.

Há pouco disse-nos que muito possivelmente vai dar por concluída a sua carreira de jogador. Já pensou no que irá fazer a seguir?
Vou parar para pensar, mas certamente que tenho a porta aberta no mundo do futebol. Vamos ver o que pode acontecer.

Para terminar a nossa conversa, conte-nos lá uma história do Manuel Cajuda.
Continuo sem me lembrar. Posso mandar um SMS quando me recordar de alguma engraçada?

15 minutos depois de finalizada a entrevista, recebemos a mensagem de Sereno: “Uma boa história do Manuel Cajuda: um dia, numa palestra, insatisfeito com algo que tínhamos feito, disse-nos: ‘querem dar nas vistas? Isto é que é dar nas vistas’. E começou a dar estaladas nos seus próprios olhos”.

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André Cruz Martins

20-04-2018



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