O “Bob Marley senegalês” que quer fazer história no Mundial

O “Bob Marley senegalês” que quer fazer história no Mundial

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O “Bob Marley senegalês” que quer fazer história no Mundial

Aliou Cissé, o único selecionador negro na competição, o preferido das russas e o mais mal pago, acredita na geração de ouro do futebol senegalês por si liderada.

Artigo de André Cruz Martins

27-06-2018

Aliou Cissé é o selecionador com o “look” mais extravagante deste Campeonato do Mundo, com as suas tranças “à Bob Marley” e foi eleito pelas mulheres russas como o treinador mais atraente da competição. Questionado sobre este facto na conferência de imprensa de antevisão do último jogo com o Japão, não escondeu o embaraço. “Não sabia que era considerado um ‘sex symbol’! Eu pelo menos não me considero como tal, mas terão de perguntar às senhoras russas. Há vários ‘Aliou Cissés’ no Senegal e espalhados pelo mundo, mas é bom que gostem de mim”, reconheceu.

No entanto, aquele que é o treinador mais jovem (42 anos) e único negro entre os seus pares, destaca-se por muito mais do que a sua imagem. Já ninguém lhe tira o mérito de ter conduzido o Senegal à primeira vitória de uma equipa africana neste Campeonato do Mundo (2-1 à Polónia na primeira jornada do Grupo H). No segundo jogo, o Senegal empatou 2-2 com o Japão, com quem partilha a liderança, com 4 pontos e os mesmos quatro golos marcados e três sofridos.

Mané e a geração de ouro do futebol senegalês

Aliou Cissé lidera aquela que os jornalistas locais apelidam como a geração de ouro do futebol senegalês, na qual se destaca Sadio Mané, avançado do Liverpool FC. “Sei que todo o continente africano nos estava a apoiar no nosso primeiro jogo. Recebi telefonemas de todo o lado e estamos orgulhosos de representar África”, reconheceu, enaltecendo a estratégia que foi usada para derrotar os polacos: “Preparámos bem este jogo e conhecíamos bem a equipa que íamos defrontar. Apresentámos o sistema indicado para parar uma das melhores seleções europeias”.

Aliou Cissé acredita que vai chegar um dia em que uma equipa africana seja campeã mundial. “Isso irá acontecer, tenho a certeza. Reconheço que é um pouco mais difícil para os países africanos, pois temos uma realidade diferente das equipas de outros continentes, mas estou seguro de que o Senegal, a Nigéria e outros países poderão fazer o mesmo que o Brasil, Alemanha e outros países europeus e ganhar esta competição”, refere.

É o selecionador mais mal pago do Mundial

Por outro lado, não esconde a desilusão pelo facto de ser o único técnico negro entre os 32 presentes no Mundial. “É uma realidade dolorosa. Já vemos tantos jogadores africanos em países europeus e clubes importantes, mas falta dar esse passo aos treinadores”, reconhece. De resto, Aliou Cissé é o selecionador presente no Mundial que aufere um salário mais baixo. De acordo com o site “Totalsportek”, são 200 mil euros por ano, numa lista liderada pelo selecionador alemão, que aufere 3,85 milhões de euros. Fernando Santos aparece na sexta posição, com 2,25 milhões.

Aliou Cissé foi um dos melhores jogadores da história do Senegal. Jogava a médio defensivo (ocasionalmente a central) e fez carreira em clubes franceses (LOSC Lille, Sedan, Montpellier HSC, PSG e Olympique Nimes) e ingleses (Birmingham City e Portsmouth FC).

Aliou Cissé era o capitão do Senegal na epopeia de 2002

Era o capitão do Senegal na única e excelente prestação do país num Campeonato do Mundo, em 2002, quando chegou aos quartos de final e bateu a França, campeão mundial em título, no jogo de estreia. Omar Daf, Tony Sylva e Lamine Diatta, outros futebolistas que fizeram parte desse grupo, são atualmente seus adjuntos na seleção. Ainda em 2002, pertenceu à equipa finalista vencida na Taça de África das Nações e foi um dos jogadores que falhou no desempate por grandes penalidades, “entregando” assim o troféu aos Camarões.

As boas prestações no Mundial valeram-lhe a transferência para o Birmingham City, mas revelou grandes dificuldades de adaptação ao rigor dos árbitros da Liga inglesa: foi expulso no jogo de estreia, depois de cumprido o castigo, viu cinco amarelos em seis jogos e chegou ao final de dezembro com dez amarelos na competição.

Perdeu 11 familiares num acidente de ferry

Foi precisamente por estes tempos (setembro de 2012) que viveu uma tragédia, ao ver 11 membros da sua família morrerem no desastre do ferry Le Joola, na Gâmbia, que provocou 1863 mortes e em que apenas 64 pessoas sobreviveram. E só soube do sucedido mais de 24 horas depois do terrível acidente. “Já era final de noite e estava a ver televisão no meu apartamento em Birmingham, quando recebi um telefonema de um amigo inglês a contar-me que um navio tinha afundado, com milhares de mortos. Mudei de canal e vi que estavam a mostrar um mapa do Senegal e percebi que algo de grave se tinha passado”, começou por contar alguns depois depois da tragédia.

Algumas horas depois lá conseguiu entrar em contacto com uma pessoa no Senegal, que lhe deu a terrível notícia. “Tinha perdido 11 familiares, entre primos, tios, tias, sobrinhos e sobrinhas. Os meus pais não me queriam contar, porque eu tinha um jogo muito importante poucos dias depois, mas claro que o futebol passou para segundo plano”, sublinhou.

Ocupa o cargo desde 2015

Aliou Cissé é treinador desde 2012, tendo-se estreado como adjunto da seleção senegalesa de sub-23. Um ano depois, assumiu o cargo de técnico principal nesse escalão e passou a ser o selecionador nacional A em 2015, rendendo Amara Trouré.

Depois de conseguido o grande objetivo de qualificar o Senegal para o Mundial da Rússia, a estreia não podia ter sido melhor, com um triunfo por 2-1 sobre a Polónia, ao que se seguiu o empate com o Japão. Esta quinta-feira, joga a qualificação para os oitavos de final no jogo com a Colômbia e basta-lhe o empate. Em caso de derrota, seguirá em frente caso perca por uma diferença menor do que uma eventual derrota do Japão com a Polónia. Caso se verifique o mesmo resultado nos dois jogos, passará a seleção com melhor folha disciplinar.

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André Cruz Martins

27-06-2018



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